BIBLIOTECA do CRED-DM ONLINE
A 27 de Abril, o CRED-DM inaugurou a sua biblioteca jurídica.
Com um acervo fisico de cerca de 5 mil livros, esta biblioteca conta com diversas áreas, nomeadamente, ciências jurídicas, história e relações internacionais.
É com muito orgulho que o CRED-DM tem no seu espólio parte da biblioteca jurídica pessoal do Senhor Professor Doutor Armando Marques Guedes, mui distinto professor da Faculdade de Direito de Lisboa.
Esta mesma biblioteca tem disponível online todo o seu catálogo assim como algumas das suas publicações.
Entrevista | Maria do Céu Oliveira, técnica bibliotecária da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
Por: Helder Fernando
Está em andamento o acordo entre a Fundação Rui Cunha e a Faculdade de Direito de Coimbra, para já na organização da Biblioteca desta Fundação. Maria do Céu Oliveira, técnica de biblioteca daquela Universidade, deslocou-se a Macau para organizar os primeiros milhares de livros da biblioteca da FRC. Fala ao Hoje Macau do trabalho que desenvolveu durante dois meses, conta-nos num traço o ambiente da “sua” Biblioteca em Coimbra. Quem disse que os bibliotecários são pessoas obscuras, sem humor, e que as bibliotecas são organismos passivos? Há um intenso movimento. E os profissionais são dinâmicos, alegres com a vida e com a sabedoria adquirida. O Nobel Jorge Luís Borges era bibliotecário quando foi preso no primeiro consulado de Péron, sendo mais tarde director da Biblioteca Nacional da Argentina e o escritor e poeta que se sabe. Berlioz, Engels, tantos. A técnica de biblioteca que hoje nos fala, dignifica a profissão de forma elegante e objectiva. Considera positivamente inesquecíveis as semanas que trabalhou na Fundação Rui Cunha.
Ao abrigo do acordo entre a Fundação Rui Cunha e a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, veio a Macau para organizar a biblioteca daquela Fundação. Trabalho terminado?
O trabalho não acabou, para grande mágoa minha. O tempo disponível foi relativamente curto, tenho a minha actividade na Biblioteca da Faculdade de Direito em Coimbra, não foi possível prolongar mais o meu tempo em Macau. Neste momento a Biblioteca da Fundação Rui Cunha já contém cerca de cinco mil livros, é um volume considerável para organizar.
Nessa organização seguiu critérios diferentes dos que são utilizados na Biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra?
Segui idêntico critério utilizado na casa onde trabalho, embora naturalmente com algumas adaptações. Separei os livros de Direito e os de Literatura por grupos. Como deve ser, dentro do Direito há várias subdivisões, tudo isso tem de ter a sua identificação muito específica e o seu lugar adequado. O serviço de biblioteca é muito diversificado, desde o carimbar, registar, catalogar, depois a introdução de dados, a classificação, colocar organizadamente nas prateleiras, etc. Tudo isto leva o seu tempo, sendo necessário uma formação específica. Mesmo depois desta formação, há uma necessidade imperiosa de muita prática para se conseguir realizar um serviço minimamente perfeito.
Uma biblioteca naturalmente vocacionada para todas as áreas do Direito.
Absolutamente. Os livros de Direito preenchem, neste meu trabalho em Macau, a grande preocupação da própria Fundação e dos seus extraordinários profissionais, como minha também. Ainda falta o aspecto da catalogação.
Regressará a Macau para nova colaboração com a Fundação Rui Cunha?
Não sei, não depende de mim, mas quem sabe? O que me satisfaz é o facto de ter tentado transmitido o básico para dois elementos que trabalharam ao meu lado, por exemplo uma jovem muito empenhada que me pareceu bastante empenhada em prosseguir parte das tarefas que me viu desenvolver, por certo que o fará. Disponibilizei-me para, mesmo à distância, tirar dúvidas.
Como observou a preocupação de uma fundação muito jovem, como a Fundação Rui Cunha, ter a reconhecida preocupação de possuir e disponibilizar uma biblioteca não apenas literária, mas também ou sobretudo técnica dirigida às áreas do Direito?
Devo dizer que fiquei muito agradavelmente surpreendida. O Dr. Rui Cunha tem uma atitude muito nobre para com este espaço geográfico que é Macau e que ele certamente ama mais que ninguém. É realmente de louvar toda a sua atitude, o seu trabalho reconhecidamente a favor de Macau. Para mim é obviamente uma honra muito grande ter vindo pela primeira vez até Macau, observar tudo e particularmente os trabalhos, as iniciativas do Dr. Rui Cunha, todo o trabalho das pessoas que directamente colaboram na Fundação. São pessoas excepcionais! Para além do nível profissional, pelo convívio fraterno que têm tido comigo – e deixe acrescentar que tenho sido tratada maravilhosamente por todos! O que me tem deixado por vezes com uma pontinha de emoção.
A imagem de um bibliotecário, ou de um técnico de biblioteca, ainda hoje é relacionada com uma pessoa solitária, tímida, circunspecta, que vive obsessivamente por entre livros…
Realmente pode haver essa ideia, mas não corresponde, dentro do que testemunho, à realidade. Penso até que talvez nunca tenha sido bem assim. O cidadão comum naturalmente sabe pouco do que é o trabalho no interior de uma biblioteca. Falo com experiência, há muitas pessoas, ainda hoje, imaginando o trabalho de um técnico de biblioteca, que é o meu caso, como uma pessoa que atende o leitor quando ele vai a uma sala de leitura de uma biblioteca. Ora tanto um bibliotecário como um técnico de biblioteca possuem uma série de conhecimentos específicos para levar a cabo toda uma série de tarefas até que o livro esteja disponibilizado para o leitor poder consultá-lo.
Na sua actividade profissional lida diariamente com oceanos de informação…
É verdade, se bem que não seja uma biblioteca geral, é uma biblioteca direccionada para um determinado perfil de leitor: basicamente, os alunos das licenciaturas, os docentes ou investigadores tanto da Universidade como do exterior, incluindo outras universidades.
Existe relacionamento entre o técnico de biblioteca e o conhecimento que o rodeia?
Dependerá de cada um a dimensão desse relacionamento. O facto é que, de certo modo, tem de se relacionar, mesmo não sendo no seu todo. Dou um exemplo, a nossa bibliotecária, não sendo licenciada em direito, é uma bibliotecária de uma biblioteca com as características de pertencer a uma Faculdade de Direito. Ela tem de conviver com o conhecimento pelo menos mínimo dos professores que trabalham na Faculdade, da bibliografia de que eles necessitam. Tem de haver uma relação muito próxima entre a bibliotecária e os docentes, porque são estes que fazem as propostas para aquisição das obras que lhes interessam. Portanto, não é, de forma alguma, como em muitas ocasiões se julga, um trabalho isolado, tímido. Isso não pode acontecer ali nem em qualquer biblioteca.
Uma pessoa bibliotecária ou técnica de biblioteca, tem muito de investigador.
Absolutamente, desde logo localizar com precisão a informação pretendida e disponibilizá-la ao leitor.
A tecnologia actual também é importante numa biblioteca?
Importantíssima, direi que já não poderíamos viver sem ela. Através da tecnologia, dos sistemas informáticos e das bases de dados, damos conhecimento ao leitor, seja ele especializado ou um leitor comum, como também acontece.
Apesar de a Biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra ser, obviamente, direccionada para determinada área, ela proporciona a existência de uma comunidade de leitores?
Qualquer pessoa, incluindo o cidadão comum, tem acesso a esta biblioteca, até porque, apesar de ser específica, é uma biblioteca pública. Naturalmente que esse leitor sabe que ali só poderá encontrar obras relacionadas com o Direito nas suas mais variadas secções. Uma biblioteca geral tem um perfil completamente diferente, uma vez que dispõe de obras para os mais diferentes interesses. Temos leitores frequentes, habituais, é um espaço onde também se pode estudar, temos salas de leitura em espaços diferentes. O espaço é cada vez mais pequeno, pelo movimento de leitores e pelo aumento constante das obras que vamos tendo. Existe um projecto do arquitecto Siza Vieira para remodelação da antiga Faculdade de Farmácia. Se for concretizado, passará a ser a Biblioteca da Faculdade de Direito.
Há influência da biblioteca nas empresas que optam por ter cultura empresarial própria, influência nos hábitos de leitura, entre outras coisas. Esse papel também pode ser desempenhado por uma biblioteca?
Talvez isso deva partir mais de quem frequenta as bibliotecas de uma maneira geral, devia depender, como disse, da cultura da empresa relacionada com o empenho em aumentar e fazer aumentar aos seus colaboradores o nível de conhecimentos. Também há exemplos de empresas que se preocupam em organizarem as suas bibliotecas muito próprias com informação disponível para os seus funcionários. Em casos destes já poderemos falar que uma biblioteca pode exercer influência nos hábitos de leitura.
Cada vez mais, a necessidade de retirar a ideia de que a biblioteca é um organismo passivo.
Nem pode ser. No caso da biblioteca onde exerço funções, é dessa que melhor posso falar, há um movimento constante, temos leitores desde as 9h da manhã até às cinco e meia da tarde. No caso da sala principal de atendimento, penso que se o horário fosse alargado, ainda mais leitores teríamos. A Sala de Revistas, que é uma sala belíssima tem permanentemente leitores até à hora de encerramento. A Sala de Leitura dos alunos, excepto o tempo de férias, está sempre repleta. Uma biblioteca não pode ser passiva, tem pessoas a trabalhar, pessoas a requisitar obras, a estudar, a investigar, para se actualizarem, para aumentarem o seu nível de conhecimentos.
Não é o seu caso, mas tem opinião sobre as bibliotecas itinerantes, as bibliotecas escolares?
As bibliotecas itinerantes, fazendo chegar livros a locais onde não existe organismo que faculte obras para consulta pública em geral, são uma boa solução para quem gosta de ler, para quem gosta de se cultivar. É um princípio de desenvolvimento do gosto pela leitura, que levará as pessoas a frequentar, quando possível, outras bibliotecas mais completas.
Quem trabalha numa biblioteca adquire vício de leitura?
Também dependerá de cada pessoa. No entanto, há a circunstância de não termos tempo para ler. É uma pena, mas essa é a verdade, não temos tempo. Posso dizer que na “minha” biblioteca existe muito, muito trabalho. Somos sete técnicas dentro de uma sala onde estamos permanentemente a trabalhar, muito intensamente, inclusivamente fazendo tarefas que habitualmente não seríamos nós a executar, não nos sobrando tempo para ler como naturalmente tanto desejaríamos. Remetemos a satisfação dessa vontade, desse interesse para as horas vagas.
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